- Lais Locatelli

- 15 may
- 3 Min. de lectura
Actualizado: 15 jun

A psicanálise é uma experiência.
E sabemos que somente é possível aprender com as nossas próprias
experiências.
Por isso que, por mais teorias que estudarmos, não é esse o lugar que a
psicanálise irá acontecer.
Ali é onde ela se transmite: nas palavras de livros, cursos, nos ensinamentos que
nos são transmitidos.
Mas se não houver um divã (simbolicamente) não haverá análise.
E onde não há análise, não há psicanalista.
Freud é categórico quanto a isso: Sem análise, sem analista.
Essa experiência, sempre singular, nos permite compreender, primeiro de tudo,
a nossa singularidade, a respeitar a nossa estrutura de personalidade, a nos colocarmos a
trabalho nas nossas neuroses e sintomas e saber sobre o universo que é nossa psique por
estarmos ciente da imensidão dela.
E, sabendo disso, passando por essa jornada da alma, poderemos, então, nos
aventurar, com muita responsabilidade e ética, a acompanhar cada um dos nossos
singulares psicanalisandos.
Cada um trará consigo para o divã o seu um universo particular.
Ainda, é na nossa análise pessoal que vamos vivenciar que o tempo lógico não
só não é o cronológico como é imperativo de ser respeitado para que opere os seus
efeitos.
Tudo a seu tempo.
Ou melhor, tudo no tempo do sujeito desejante.
Que o nosso desejo de sermos e estarmos na função de psicanalistas não atropele
o desejo e o tempo dos nossos psicanalisandos.
Não adianta chegarmos marretando as paredes defensivas nem tentar arrancar os
sintomas com as unhas.
Vemos muitos processos terapêuticos que usam essas “técnicas” que, além de
deslocar os sintomas para outros lugares (internos), geram mais defesas.
E, se algum sintoma tem um lugar para o sujeito, esse lugar foi necessário
porque a pulsão não encontrou um melhor destino para se satisfazer.
Como psicanalistas poderemos estar, contando com a transferência, junto com os
nossos pacientes buscando um melhor caminho possível para a pulsão deles.
Uma melhor distribuição, assim que for possível fazer um desinvestimento nos
sintomas, sendo eles de estimação ou não.
Isso porque não somos, estamos.
E essa plasticidade nos revela que os diagnósticos somente servem na
psicanálise como um fio condutor do processo psicanalítico, não como uma letra
escarlate: não é algo declarado, ocupa os bastidores para que no palco esteja o sujeito,
sem julgamentos, sem aplausos nem vaias.
Vamos escutar a dor e suas cores e entender o porquê dele ainda estar pintando
com giz de cera quando poderia estar fazendo esculturas de mármore.
É disso que se trata e é isso que se trata: o que causa sofrimento ao sujeito ter um
outro destino, para o sintoma ter uma dissolução, para que as emoções passem a ter
nomes próprios e para o Eu ser o administrador da própria casa – conscientes que ele
nunca será o Senhor da morada que compartilha com o Isso e com o Supereu.
Porque mudamos, expandimos e nos reinventamos.
E amanhã é possível estar em outro lugar, com uma nova cota de tudo que nos
compõe, sabendo que nada que é do ser humano nos é estranho, e o mais de acordo com
a realidade que for possível, vendo a vida como é – o único lugar capaz de nos
apaziguar, com o sempre tênue equilíbrio do princípio do prazer com o princípio da
realidade.
E sabemos, porque passamos muito tempo no divã para poder chegar nesse
lugar, não só de analistas, mas de equilibristas.
Texto publicado no livro Cartas a uma jovem analista
Organizado por Ana Cristina R. Bernardes
Editora Calligraphie
2005
























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